Além dos desafios inerentes a qualquer negócio, quem empreende no Brasil precisa estar disposto a enfrentar uma perigosa e crescente concorrência, que – por transgredir as regras do jogo – desequilibra o mercado. Trata-se do comércio ilegal de produtos, que, apenas no Estado de São Paulo, movimentou em 2015 nada mais nada menos que R$ 13,26 bilhões, segundo o estudo Anuário 2016: Mercados Ilícitos Transnacionais em São Paulo, produzido pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Repetiu-se assim o resultado do ano anterior, quando o mercado ilícito havia movimentado R$ 13,24 bilhões.
Os resultados similares de 2014 e 2015 podem transmitir uma equivocada impressão de estagnação do comércio ilegal. Na verdade, houve nos últimos anos um vertiginoso crescimento. Basta ver que, em 2010, o mercado ilícito havia movimentado R$ 6,71 bilhões, quase a metade dos resultados de 2014 e 2015.
No cálculo da Fiesp, que incluiu nove setores – alimentos, automóveis, brinquedos, eletrônicos, higiene e perfumaria, medicamentos, químicos, tabaco e vestuário –, considerou-se a comercialização de produtos roubados, furtados, contrabandeados e pirateados.
Os maiores rombos foram encontrados nas indústrias de tabaco e de automóveis/autopeças, onde as vendas da concorrência ilegal somaram, respectivamente, R$ 4,25 bilhões e R$ 3,49 bilhões no ano passado. Já em porcentual de mercado, o setor de eletrônicos obteve a primeira posição, com os produtos ilícitos representando 11,9% do comércio do setor. Em seguida estavam os brinquedos, com 11,1% de itens ilegais.
Em cada setor, a ilegalidade tem uma modalidade predominante. No caso dos cigarros, por exemplo, a quase totalidade do comércio ilegal (99,5%) são produtos contrabandeados. De acordo com Fernando Bomfiglio, diretor do Sindifumo, Sindicato da Indústria do Fumo de São Paulo, cerca de 30 bilhões de cigarros – ou 30% do consumo total – entram a cada ano no País como contrabando. Segundo a Associação Brasileira de Combate à Falsificação, 85% dos cigarros contrabandeados vêm do Paraguai, entrando por Foz do Iguaçu (PR) e pelo Rio Apa (MS).
Uma vez que os impostos respondem por pelo menos 70% do valor do cigarro produzido de forma regular no Brasil, os contrabandistas têm uma enorme vantagem competitiva. Conseguem impor altas margens de ganho – cobram até três vezes mais do que haviam pago – e mesmo assim seus preços são a metade do valor praticado no comércio regular.
“A atratividade se dá pela combinação de alto lucro e baixa punição do contrabando”, afirma Bomfiglio. Além disso, a crise econômica torna ainda mais atrativos os preços praticados no comércio ilegal e faz com que a atividade seja vista, por parte da população, como uma oportunidade de trabalho, num cenário de crescente desemprego.
De acordo com a Fiesp, o comércio ilegal, ao concorrer deslealmente com o setor regularmente estabelecido, impede a criação de 111,6 mil empregos formais, o que poderia significar uma geração de renda, entre salários e lucro, de R$ 3,02 bilhões.
Além de concorrer em desigualdade de condições com o comércio regularmente estabelecido, o mercado de produtos ilícitos acarreta uma diminuição na arrecadação de impostos. Estima-se que, em 2015, a movimentação ilegal de mercadorias gerou no Estado de São Paulo perdas de R$ 2,81 bilhões em impostos federais e de R$ 2,54 bilhões em impostos estaduais. O valor que o governo federal deixou de arrecadar seria suficiente para construir 1,5 mil escolas de ensino básico.
Além de agravar a situação fiscal, diminuindo a capacidade de atuação do poder público, o comércio ilegal desestimula investimentos, dificulta a criação de empregos e gera custos adicionais para quem quer empreender de forma regular. Longe de ser um mal menor, o mercado ilícito é um grave problema, não merecendo qualquer tolerância.
Fonte: o Estado de de S.Paulo