Demanda por tecnologia 5G pode aumentar litígios sobre patentes

Competitividade após implementação da tecnologia, vista como revolucionária, depende de soluções regulatórias

Litígios relacionados a patentes essenciais, nas quais o detentor é obrigado a licenciar para concorrentes, são uma preocupação na implementação da tecnologia 5G no Brasil. O governo brasileiro se prepara para o leilão das frequências que serão usadas pela rede, início do processo de implementação da tecnologia – ela já é usada em países como Alemanha, China, Estados Unidos e Japão.

A demanda por conectividade poderia aumentar as disputas, se não houver parâmetros sobre a situação sob o ponto de vista de patentes essenciais e condutas anticompetitivas no Brasil. Nesta terça-feira (8/6), a Casa JOTA discutiu esse cenário sob o ponto de vista jurídico, em webinar patrocinado pela Ericsson.

A rede 5G é apontada como tendo potencial revolucionário para o desenvolvimento e implementação de diferentes tecnologias, indo além da conexão de banda larga em smartphones. “A evolução do 4G para o 5G é muito disruptiva. É assim pela altíssima velocidade e também pela alta capacidade de transportar dados”, disse Caroline Castro Nunes, pesquisadora do escritório Baptista Luz. Assim, são esperadas conexões mais estáveis e que permitam conectar muitos dispositivos à internet ao mesmo tempo.

Nesse sentido, há uma enorme relação em cadeia entre diferentes tecnologias, que devem ser ampliadas pelo avanço do 5G. Isso pode criar tensões entre criadores de patentes que proporcionam o uso da rede e empresas que pretendem explorá-la em novos produtos. Para viabilizar o acesso à tecnologia, fundamental para a inovação, existe a figura da patente essencial. Nesse caso, há direito a exclusividade com a contrapartida de licenciamento do uso, com pagamento de royalties.

No Brasil, ter regras claras sobre como isso deve se dar pode ser crucial para o fomento da inovação no país. “Ter licenciamento é muito importante para o mercado brasileiro. Se não for possível que as empresas brasileiras acessem o 5G, elas vão ficar alijadas do mercado internacional. Por isso, há necessidade de o Brasil criar pontes para que empresas brasileiras negociem com as certificadoras de 5G internacionais”, defendeu José Mauro Machado, sócio responsável por patentes no Pinheiro Neto.

Na ótica dele, estabelecer diretrizes seria importante para transmitir a “mensagem correta” sobre como o país lida com propriedade intelectual e abuso do poder econômico, o que não teria acontecido no passado. “O problema acontece quando a exclusividade é usada de forma abusiva, impedindo a democratização da tecnologia. Foi o que o STF discutiu no caso das patentes farmacêuticas, mas após 30 anos de lei vigente”, disse, em referência ao julgamento em que, em maio, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a extensão de patentes farmacêuticas ultrapassando 20 anos de prazo.

O que se pretende evitar é que disputas pontuais recaiam no Judiciário, quando poderiam ter sido antecipadas. “A solução fácil seria apostar em judicialização quando houver anticompetição, mas não vejo como o Judiciário conseguiria lidar com uma situação complexa de propriedade intelectual e abuso do poder econômico. Os reguladores precisam tomar parte nesse debate”, apontou Luciano Timm, professor de Direito Econômico e de Direito e Economia da FGV- SP.

Na esfera regulatória, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) é autoridade brasileira antitruste, mas há poucos casos que chegaram até ele tratando especificamente de propriedade intelectual. Além disso, o órgão tem dificuldade para lidar com questões entre partes que não são concorrentes.

“O Cade tem pouca experiência em abuso de direito de propriedade intelectual. É difícil dizer para qual linha a autarquia tende, mas ela costuma olhar para as condutas sob a perspectiva do bem-estar do consumidor, como queda de oferta ou serviço de pior qualidade”, afirmou Vinicius Marques de Carvalho, professor da USP e ex-presidente do Cade.

Segundo ele, as discussões sobre abuso em patentes essenciais geralmente se dão quando o detentor nega acesso à infraestrutura para empresas atuantes em outras etapas do mercado. “O grande questionamento antitruste em relação a isso é como definir as obrigações. Garantir o acesso não é suficiente para resolver esse problema, mas também se ele será a partir de um preço regulado ou não”, avaliou.

Entre os pontos a serem regulamentados, há ainda a demanda por padronização no oferecimento da tecnologia. “Padronizar é importante para facilitar o uso por todos, pois há indícios de que reduz as barreiras comerciais, abre os mercados, incentive a concorrência e inovação, diminui o preço final ao consumidor, permite a conexão entre os sistemas”, explicou a pesquisadora Caroline Nunes. Tanto a padronização quanto o acesso a licenciamento podem ser importantes para incentivar a democratização do acesso à rede.

Por: LETÍCIA PAIVA


Fonte: JOTA | Clipping: LDSOFT
Foto: Jota


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