Robert Daniel-Shores e Roberta Arantes – Sócios da Daniel Advogados
Em meio à pandemia da COVID-19 e a paralização de diversas atividades econômicas para conter a circulação de pessoas e frear a disseminação do vírus, uma empresa brasileira de fragrâncias requereu junto ao INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial), a marca “CoronaVírus” para identificar seus desinfetantes, preparações farmacêuticas, fungicidas e pesticidas, além de outros produtos de higiene.
O pedido de registro da marca “CoronaVirus”, o primeiro a conter este termo que se tem notícia no Brasil, foi apresentado no início do mês de março, conforme divulgou, no último dia 31, o INPI que terá a árdua missão de analisar a registrabilidade da marca à luz da legislação vigente, podendo garantir, ao final, exclusividade ao requente do registro. Isso permitiria, por exemplo, a empresa de impedir o uso comercial da expressão por terceiros sem a sua autorização.
É pouco provável que a empresa requerente tenha desenvolvido qualquer solução permanente contra a COVID-19. O que levaria, no entanto, uma empresa a querer identificar os seus produtos com termo que remete a algo tão negativo como uma pandemia que vem causando tanto impacto na vida das pessoas? A prática de se requerer como marca uma expressão ou termo que vem ganhando notoriedade (ou, melhor, infâmia) não é nova, apesar de mais comum em outros países, como nos EUA.
Por lá, não raro, inúmeros pedidos para se registrar marcas conhecidas como “oportunistas” são feitos por empresas e indivíduos. O intuito, em geral, é explorar comercialmente o termo e, ao mesmo tempo, impedir outros de o utilizarem. Para exemplificar, nos EUA tem-se notícia de indivíduos tentando registrar expressões como SEPTEMBER 11, JE SUIS CHARLIE, BOSTON STRONG e até mesmo TERRORISM como marcas. E sim, já existem diversos pedidos para se registrar marcas relacionados ao COVID-19, como LOVE IN THE TIME OF CORONAVIRUS, MY CORONAVIRUS EXPERIENCE e… COVID-19!
Sempre que há um evento ou fato relevante que capture a atenção das pessoas, outras correm para tentar comercializá-la. Fica, então, a dúvida se esses termos podem, do ponto de vista legal, serem concedidos como marcas.
No Brasil, a Lei da Propriedade Industrial (9.279/96) determina que certos sinais não são registráveis como marca, incluindo, no seu rol proibitivo, expressões contrárias à moral e aos bons costumes; expressões de caráter genérico, necessário, comum ou vulgar; ou termos técnicos usados na indústria ou na ciência. O desfecho do caso, no entanto, é incerto, vez que a interpretação destes dispositivos envolve outros aspectos como o segmento de mercado do requerente e o risco ao consumidor.
Uma decisão sobre o registro ou não da marca “CoronaVírus” deve ser divulgado pelo INPI dentro de 6 a 8 meses. Até lá, torcemos esperançosos para encontrar o mundo em situação melhor, com marcas mais criativas e capazes de reconfortar as pessoas e incentivar o reaquecimento da economia.
(*)processo no INPI n. 919314376 passível de consulta através do link https://gru.inpi.gov.br/pePI/jsp/marcas/Pesquisa_classe_basica.jsp)