Por Ana Carolina Sabóia Bertoletti – Advogada do escritório Camelier Advogados Associados.
Para que a marca de posição se enquadre no requisito da distintividade, é necessário que a aplicação do sinal ao objeto resulte em um conjunto distintivo, sendo percebido como marca.
Quando falamos de marca, estamos diante de um instituto muito importante. Isso porque, além de permitir que o empresário concorra no mercado, a marca é uma ferramenta poderosa para ampliar a competitividade e permitir o desenvolvimento econômico e social.
Nesse sentido, o artigo 122 e 123 da Lei nº 9.279/96 definem marca como o sinal visualmente perceptível, cujo objetivo é identificar, distinguir e certificar produtos e serviços de outros produtos e serviços de origem diversa, em um mesmo ramo de atividade.
Dentre suas espécies, as marcas podem ser divididas da seguinte forma: marcas convencionais, cujo conceito está diretamente relacionado ao fato de ser visualmente perceptível, podendo ser classificadas quanto sua forma de apresentação: são as marcas nominativas, figurativas, mistas e tridimensionais e, quanto ao uso: são as marcas de produto ou serviço, coletivas ou de certificação. Já as marcas não convencionais são aquelas que não estão inseridas no conceito do artigo 122 da Lei nº 9.279/96, porém, são capazes de identificar os produtos/serviços, bem como gerar atratividade por meio de outras percepções ou sentidos, por exemplo, as marcas gustativas, olfativas, sonoras, marcas em movimento, marcas de posição, entre outras.
O surgimento das marcas não convencionais está atrelado ao desenvolvimento e internacionalização do comércio, situação que fomentou a concorrência entre empresas, fazendo com que muitas delas sofisticassem seus produtos e serviços, criando um diferencial para atrair a atenção do público consumidor. Este fenômeno levou não apenas à criação de novos produtos e novas formas de oferecer serviços, como também possibilitou mudanças na própria maneira de identificá-los.
Nesse sentido, a marca de posição caracteriza-se pela soma das seguintes características: (i) posição distintiva e peculiar do sinal, de maneira permanente e fixa; (ii) o sinal deve ser posicionamento em um local que não seja comumente utilizado pela concorrência; (iii) conjunto visual distintivo; (iv) capacidade de ser identificado como marca pelo mercado de consumo e (v) capacidade de individualizar e diferenciar o produto de outros iguais e/ou semelhantes.
Ora, sendo a marca de posição um elemento que sempre aparece no produto em uma determinada posição, com proporções constantes, o que justifica a ausência de previsão legal sobre sua registrabilidade na legislação brasileira?
O Acordo TRIPS (Trade Related Aspects of Intellectual Property Rights) estabeleceu padrões mínimos1 de proteção para as marcas não convencionais, mas também permitiu que os seus signatários restringissem a aplicação dos respectivos padrões. Logo, no Brasil, o registro estaria limitado apenas para as marcas visualmente perceptíveis, sendo as marcas de posição protegíveis apenas pelas normas de repressão à concorrência desleal (artigo 195, inciso III, da Lei nº 9.279/96, artigo 10 bis da CUP e outras).
Todavia, em uma leitura atenta da Lei nº 9.279/96, os artigos 122 e 124 não vedam a registrabilidade da marca de posição.
A posição, por si só, jamais seria admissível para registro como marca. Porém, o emprego de um sinal em determinada posição poderá compreender um sinal distintivo em função da impressão do conjunto, possibilitando a identificação ou individualização de um produto.
1 Artigo 15 TRIPS: 1. Qualquer sinal, ou combinação de sinais, capaz de distinguir bens e serviços de um empreendimento daqueles de outro empreendimento, poderá constituir uma marca. Estes sinais, em particular palavras, inclusive nomes próprios, letras, numerais, elementos figurativos e combinação de cores, bem como qualquer combinação desses sinais, serão registráveis como marcas. Quando os sinais não forem intrinsecamente capazes de distinguir os bens e serviços pertinentes, os Membros poderão condicionar a possibilidade do registro ao caráter distintivo que tenham adquirido pelo seu uso. Os Membros poderão exigir, como condição para o registro, que os sinais sejam visualmente perceptíveis.
Distintividade há muito já agregada pelas empresas aos seus produtos, mas que não foi acompanhada pela legislação, fazendo com que discussões sobre a proteção das marcas de posição chegassem ao Poder Judiciário.
Dentre os casos, podemos citar o AgRg no REsp nº 638.033/RJ2 que tratou sobre a marca posta no bolso da calça jeans Levi’s. Nessa ocasião, restou sedimentado o entendimento de que as linhas de costuras posicionadas no bolso da calça jeans são passíveis de proteção. Em um segundo caso, embora reconhecida a prescrição da pretensão de nulidade parcial, os Desembargadores do 2ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região3 teceram comentários importantes sobres as três listras da ADIDAS, nos seguintes termos: “(…) Cumprindo reconhecer que o uso maciço das três listras nas laterais de calças, blusas e agasalhos, associado ao famoso slogan – ADIDAS A MARCA DAS TRÊS LISTRAS – reforçou soberanamente a identidade da marca – fazendo com que o consumidor começasse a perceber as três listras como verdadeiras assinaturas dos produtos.”
Frente a tais desafios, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), aos 13 de abril de 2021, na Revista da Propriedade Industrial nº 2.623 abriu Consulta Pública para examinar as solicitações sobre o registro de marcas de posição e, após o estudo, publicou a Portaria/INPI/PR nº 37 de 13/09/2021 e a Nota Técnica INPI/CPAPD nº 02/2021, de 21/09/2021, dispondo sobre a registrabilidade das marcas de posição.
De acordo com o INPI, a marca de posição deve ser indicada em linhas contínuas ou em áreas preenchidas e, o suporte deve ser representado em linhas pontilhadas ou tracejadas. Ademais, o pedido deverá ser acompanhado por um texto com a descrição da marca e aquilo que o depositante pretende proteger.
Assim, a partir de 1º de outubro, os interessados em pleitear o registro de marca de posição deverão se valer do Formulário Eletrônico de Marcas Tridimensionais, até que o sistema de peticionamento eletrônico do INPI disponibilize o formulário adequado para as marcas de posição.
2 Relator Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, Data de Julgamento: 07/02/2013, Data de Publicação: DJe 19/02/2013 3 0803946-89.2011.4.02.5101, Relator: DES. FED. MESSOD AZULAY NETO, 2ª Turma Especializada TRF2, Publicação: 23/02/2015, Disponibilização DJe 20/02/2015
Ainda, os pedidos de marca depositados antes da entrada em vigor da referida Portaria que estejam pendentes de exame pelo INPI e, que se enquadrem como marca de posição, poderão ser “convertidos” em marcas de posição a requerimento do interessado, no prazo de 90 dias, contados da entrada em vigor da Portaria/INPI/PR nº 37 de 13/09/2021.
Portanto, como um instituto dotado de caráter inovador, distintivo, relevante função econômica e capaz de criar um gatilho de consumo na mente do indivíduo, a regulamentação da marca de posição fomentará a aplicação de novas “assinaturas” aos produtos e garantirá maior segurança jurídica aos respectivos titulares.
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